Alguns colegas jornalistas afirmaram que o Ministério das TIC, chefiado por Sandra Urrutia, está prestes a tomar uma decisão que prejudica a arrecadação multimilionária que as receitas das renovações das licenças do espectro radioelétrico que devem ser realizadas em 2023 e 2024 significam .para beneficiar algumas empresas do setor. Acusação que ignora o contexto internacional do setor e, pior ainda, a Lei 1979 de 2019 que modificou o antigo critério de "maximização de recursos para o Estado" por "maximização do bem-estar social".
E o que é isso para maximizar o bem-estar social? Trata-se, como diz a lei, de encontrar as melhores estratégias para reduzir a exclusão digital, permitir o acesso universal, a implantação e a expansão da cobertura. E a internet móvel é justamente a tecnologia que mais facilitou a democratização do serviço, que hoje abrange quase 38 milhões de usuários no país. Mais do que qualquer outra tecnologia.
O ponto de partida dessas estratégias é a redução do preço do espectro radioelétrico, posição unânime no setor e em organismos multilaterais como o GSMA, OCDE, CAF e 5G Américas, entre outros.
Relatório da consultoria Telecom Advisory Services sobre o papel da economia digital na recuperação econômica da América Latina e do Caribe, aponta que o custo médio do espectro na região é 1,7 vezes maior do que na Europa e destaca que "Evidências empíricas mostram que quando a receita é priorizada quando o espectro é atribuído, as implantações de rede, uma vez que esse recurso é atribuído, podem ser seriamente comprometidas"; enquanto estima que uma redução de apenas 1% nos pagamentos de espectro está associada a um aumento de 0,45% na cobertura 4G nos países em desenvolvimento.
O estudo, liderado pelo renomado especialista em telecomunicações e diretor de Estudos de Estratégia Corporativa do Columbia Institute for Tele-Information, Raul Katz, propõe uma redução de 50% no custo do espectro para os países da região com os preços mais altos, entre os quais a Colômbia, que, de acordo com a GSMA, tem o segundo espectro mais caro do continente.
Estima-se que os benefícios da redução do custo do espectro seriam: diretamente, maior investimento e adoção de serviços; enquanto indiretamente haveria crescimento do PIB associado a uma maior penetração.
Precisamente esta maior penetração dos serviços de telecomunicações e o crescimento do PIB associado vão gerar aumentos na arrecadação de impostos que poderão compensar o que o Estado não arrecada devido à redução do custo do espectro, conclui o relatório.
As renovações estão chegandoções
Claro, Directv, Movistar, Tigo-UNE e WOM devem renovar as licenças que correspondem a mais da metade do espectro atribuído na Colômbia e cujo preço aumentou 14% ano a ano entre 2011 e 2021, enquanto as receitas dos serviços móveis caíram entre 50% e 70%.
Apesar destes dados, a mais recente renovação, em 2021, que correspondeu às frequências Movistar e Claro na faixa dos 1.900 MHz, foi efetuada pelo dobro da média internacional e com novos contratos a 20 anos.
Agora, o Ministério das TIC está a fazer a análise técnica com o apoio da Agência Nacional do Espectro (ANE), para definir as novas condições de renovação e utilização, que serão anunciadas nos primeiros meses de 2023, uma vez que Tigo tem de renovar 40 MHz na faixa de 1.900 MHz. Uma decisão que será fundamental para o tão esperado fechamento do fosso digital, porque gostemos ou não, essas empresas são as que mais investiram em infraestrutura para levar as comunicações a a maior parte do território colombiano.
Existem casos –além dos numerosos relatórios e estudos– que exemplificam as duas visões em discussão no contexto atual. O mais recente leilão de espectro no México – para blocos regionais nas bandas de 800 MHz e 2.5 GHz – contou apenas com a participação da AT&T e da Telcel, que mal pagaram o preço base. Além disso, a maior parte ficou deserta devido aos altos preços impostos pelo Instituto Federal de Telecomunicações (IFT) para maximizar a receita do Estado.
De fato, a Telefónica devolveu todo o seu espectro e a AT&T parte do seu porque os custos não permitem realizar uma operação sustentável.
No outro extremo está o Chile, que tem aplicado preços abaixo da média europeia nos concursos realizados para a atribuição de espectro, impondo coberturas e obrigações em espécie aos vencedores. Em termos de penetração móvel, ocupa o segundo lugar na adoção de serviços LTE na região, é o país latino-americano com maior penetração de banda larga na OCDE e já possui uma oferta 5G.
O Brasil, por sua vez, realizou um leilão de 2021G em 5 que garantiu investimentos de 9.150 milhões de dólares, dos quais 15,76% foram arrecadados e o restante (84.23%) deve ser investido em compromissos de cobertura até 2029, não só móvel, mas também para implantação de fibra ótica, inclusive por rios da região amazônica.
Com exceção da Claro, qualquer uma das operadoras do país pode pisar no freio de mão e focar em mercados mais lucrativos onde possa recuperar o investimento.
Só em 2021, as três empresas que a Asomóvil agrupa (Claro, Movistar e Tigo) investiram US$ 4,33 bilhões em infraestrutura 4G, tecnologia que é possivelmente o maior salto evolutivo nas comunicações móveis até hoje, que trouxe transmissão de vídeo em alta definição e em tempo real Tempo. No entanto, a maior parte dos lucros é obtida por empresas como Apple, Netflix, Meta e Alphabet.
A conclusão é óbvia: o valor que o governo atribui ao que chamaram de autoestrada das telecomunicações móveis tem de responder a uma conjuntura económica de inflação, desvalorização e baixos rendimentos, ou seja, um contexto de crise. E não estamos falando apenas de renovação de licenças, mas também de o leilão para 5G.
Priorizar o bem-estar social reduzindo o preço do espectro não pode ser visto como colocando em risco as finanças públicas.
Entretanto: Quando eu escrevia esta coluna, o Ministério de TIC publicava as bases para o processo de seleção de objetivos 5G para os operadores manifestarem o seu interesse nas faixas disponíveis para o futuro leilão. Uma saudação à bandeira, porque o interesse real será real quando souberem a nova valorização do espectro.